sábado, 24 de dezembro de 2022

EXPLICANDO O INCLUSIVISMO

Se Jesus é o único caminho, como Deus vai julgar os que nunca ouviram o evangelho? 


Resolvi abordar esse tema por causa da publicação que um amigo fez no Facebook sobre o perigo do inclusivismo. Contudo, quando fui avaliar a citação que ele fez de um teólogo pentescostal sobre a definição de inclusivismo, percebi que a suposta definição não corresponde ao conceito de inclusivismo propriamente dito, mas o conceito que ele apresentou representa mais o pluralismo religioso e não o inclusivismo. Aqui fica um grande alerta para nós: quando formos debater ideias, é obrigatório definir os termos corretamente por diversos motivos, primeiro, para não deturparmos o conceito abordado, criando um argumento do espantalho; segundo, para sermos coerentes e fiéis aos nossos princípios e comprometimento com a verdade e, terceiro, para não demonizarmos os cristãos que são inclusivistas. Vamos observar a citação:


Menzies também destaca um movimento preocupante em direção aos inclusivismo entre alguns teólogos pentecostais. O que é inclusivismo? É, nas palavras de seus defensores pentecostais: “As religiões não são acidentes da história nem usurpações da providência divina, mas são, de várias maneiras, instrumentos do Espírito Santo realizando os propósitos divinos no mundo e os não evangelizados, se forem salvos, são salvos por meio da obra de Cristo pelo Espírito (mesmo se mediados por meio das crenças e práticas disponíveis a eles)”. O que preocupa Menzies, e o que também me preocupa, é que o inclusivismo é, em última análise, incompatível com a missão da igreja em Marcos 16: 15. É incompatível com o evangelho.


O que o autor do livro faz? Mistura Inclusivismo com Pluralismo. O Pluralismo Religioso defende que todas as religiões levam a Deus, o que é flagrantemente falso. Para sermos fiéis ao conceito, o inclusivismo NÃO DEFENDE que todas as religiões levam a Deus, pois a lei da não contradição na lógica estabelece que as afirmações que se contradizem não podem ser verdadeiras no mesmo sentido, direção ou intensidade; DEUS NÃO usa as religiões como meio da providência para alcançar os não evangelizados no inclusivismo; o inclusivismo NÃO É INCOMPATÍVEL com a missão da igreja; Por fim, sim é verdade que no inclusivismo, se alguém for salvo entre os não evangelizados, essa pessoa será alcançada pela obra meritória de Cristo. Mas em que sentido? Qual o problema que os inclusivistas tentam resolver? Eles tentam resolver o problema dos que nunca escutaram o evangelho. Deixemos o inclusivismo falar por si mesmo.

A primeira coisa que diria em primeiro lugar, e o inclusivismo defende, é que não existe solução para o problema do pecado humano a parte da morte expiatória de Cristo. Está muito claro no N.T. que todos caíram, estão separados de Deus, são moralmente culpados diante de Deus e precisam do perdão dos pecados e a morte expiatória de Jesus na cruz é a solução de Deus para o pecado humano, então, a parte da cruz de Cristo não existe nenhuma provisão para a expiação do pecado humano, nem para a reconciliação.

A garantia de que o sacrifício de Jesus na cruz é a solução para o pecado humano é a ressurreição de Jesus. O fato de Deus ressuscitar Jesus dos mortos, vindicou publicamente, de forma inequívoca, todas as blasfêmias pelas quais Jesus foi crucificado. Então, é a ressurreição de Jesus que nos faz acreditar na eficácia do sacrifício de Jesus na cruz e é por isso que apenas Cristo, e apenas ele, é o meio pelo qual as pessoas podem receber o perdão dos pecados e a salvação e não a crença no conteúdo doutrinário de outras religiões.

Agora, isso levanta outras questões importantes e polêmicas, questões teológicas profundas e difíceis como, por exemplo, o problema daqueles que nunca ouviram o evangelho, ou seja, como eles serão julgados de forma justa? Pois seria injusto Deus os julgar e condenar por não terem crido em Jesus, apesar de nunca terem ouvido o evangelho, e Deus é justo, então o que você faria com aquelas pessoas? Então, o inclusivista crê e defende que a resposta do N.T. é que Deus julgará as pessoas com base da luz que receberam, pois aqueles que receberam apenas a luz da revelação geral – revelação natural – na natureza e na consciência, serão julgados sobre a base da resposta que deram a essa revelação, e aqueles que receberam a luz da revelação especial e do evangelho, serão julgados sobre a base da resposta que darão a essa revelação. Agora, isso não significa que essas pessoas serão salvas a parte da morte expiatória de Cristo, isso apenas significa que uma pessoa que nunca ouviu o evangelho pode ser beneficiária da morte expiatória de Cristo, mesmo sem ter uma consciência ou conhecimento de Cristo. Essa pessoa seria como alguém que descobre de repente que tem um benfeitor ou que herdou uma grande fortuna de herança de um tio que ele não tinha consciência que existia. Portanto, uma pessoa pode ser beneficiária da morte expiatória de Cristo sem uma consciência ou conhecimento de Cristo, segundo o inclusivismo. Existe paralelo bíblico para fundamentar essa afirmação ousada? Os inclusivistas pensam que sim.

Os inclusivistas afirmam que existem certas pessoas no A.T., como por exemplo, Jó, que não tinha nenhum conhecimento de Cristo, ele nem mesmo era israelita, ele nem mesmo era da linhagem abraâmica e está bem claro que Jó teve um relacionamento pessoal e real com Deus. Então, dizem os inclusivistas, parece que Deus vai julgar as pessoas com base na resposta que eles darão a luz que receberam, e que qualquer pessoa que for salva, só será salva por meio do sacrifício de Cristo. Perceba que neste contexto, o particularismo cristão é oposto ao pluralismo religioso e não necessariamente ao inclusivismo e o inclusivismo tenta responder o motivo pelo qual Jesus é o único meio de salvação (particularismo cristão) e como Deus não é injusto ao julgar as pessoas QUE NUNCA OUVIRAM FALAR DE CRISTO. Então, a salvação está disponível a todos, não há injustiça da parte de Deus nesse julgamento e a missão da igreja está mantida. Onde a igreja falhar na missão de evangelizar o mundo não evangelizado, Deus julgará os não evangelizados com base na resposta que darão a luz natural que receberam (como no exemplo de Jó - na revelação geral e na consciência e não nas outras religiões) e julgará (no que diz respeito aos galardões) os que receberam a Grande Comissão e a negligenciaram por completo. 

E sobre Romanos 10.9 que diz que as pessoas têm que confessar a Cristo para serem salvas? O inclusivismo afirma que essa é uma condição suficiente e não uma condição estritamente necessária para a salvação, ou seja, se você confessar a Cristo como Senhor e crer que Deus ressuscitou a Jesus dentre os mortos, você será salvo, mas Jó não fez isso, Moisés não fez isso, Nabucodonossor não fez isso, Melquesedeque não fez isso, então essa não é uma condição necessária com respeito aos que nunca ouviram falar sobre Cristo e isso segundo o inclusivismo, mas seria apenas uma condição suficiente para a salvação. 

Apesar de eu, Walson Sales, reconhecer que o inclusivismo tem um ponto importante, estou mais inclinado ao exclusivismo e ao particularismo cristão, ou seja, é a missão precípua da igreja, evangelizar o mundo inteiro e isso traz um peso enorme para aqueles que exercem autoridade para enviar missionários aos campos não evangelizados e não o fazem. Contudo, minha meta ao escrever este artigo não foi o de me posicionar, mas o de esclarecer o verdadeiro conceito do que é o inclusivismo. Portanto, leia sobre os verbetes Pluralismo Religioso, Universalismo, Inclusivismo e Particularismo Cristão para ter uma visão geral do significado de cada termo e não ser engolido por definições distorcidas que mais confundem que esclarecem.


Traduzido, adaptado e ampliado por Walson Sales


Referências:


William Lane Craig - Q&A - Is Jesus the only way? What about those who never heard the Gospel? https://www.youtube.com/watch?v=OQqTiNQk9Fc


Norman Geisler – Enciclopédia de Apologética


Norman Geisler – Teologia Sistemática

Prefácio ao livro do professor Wellington Galindo

 

"Por que devemos aprender sobre o Islã?" Primeiro, os números. O islamismo é a segunda maior religião na história (após o Cristianismo). Existem cerca de 1,6 bilhões de muçulmanos no mundo. Isso é mais de um quinto da população mundial. Atualmente existem mais de 1.200 mesquitas nos Estados Unidos e mais de 6.000 na Europa. E de acordo com muitas fontes, o Islã é a religião de mais rápido crescimento no mundo. Segundo, os Cristãos não podem comunicar o Evangelho claramente aos muçulmanos sem entender o que os muçulmanos acreditam, porque o Alcorão distorce o significado das reivindicações Cristãs. Em terceiro lugar, o Islã prospera em uma atmosfera de ignorância. Conheço o testemunho de convertidos ao Islã. Mas nunca conheci uma única pessoa que se converteu ao Islã depois de estudar cuidadosamente sua história e doutrina. A razão pela qual tantas pessoas se apaixonam pela propaganda islâmica é que existe uma atmosfera geral de ignorância sobre o Islã entre nós, cristãos, que permite que os pregadores muçulmanos digam praticamente tudo o que eles querem, porque ninguém vai corrigi-los. Em quarto lugar, muitos muçulmanos são tão confiantes de que o Islã é verdadeiro (porque lhes foi dito toda a vida que é indiscutivelmente a verdade) que eles não podem considerar seriamente quaisquer alternativas ao Islamismo. Em quinto lugar, os muçulmanos são treinados a desafiar as principais doutrinas do Cristianismo. Jesus ensinou aos seus seguidores muitas coisas, mas quando pregavam o Evangelho no Livro de Atos, eles pregavam que Jesus é o divino Filho de Deus, que morreu na cruz pelos pecados e ressuscitou da morte - deidade, morte e ressurreição. Estes são os três ensinamentos fundamentais do Evangelho Cristão. O Islã nega todos os três, e assim os muçulmanos são ensinados a desafiar os Cristãos nessas questões.

O Islã ensina o Monoteísmo, enfatiza a necessidade de se adorar a Deus (neste caso específico, Allah), mas qual o ponto principal entre a relação do Islã com o Cristianismo? O Islã fala de forma substancial sobre Jesus (Jesus é citado 93 vezes no Alcorão), com implicações doutrinárias profundas. Por exemplo, o Islã nega a crucificação de Jesus (Alcorão 4: 157), onde é dito que Jesus nem foi morto, nem crucificado. Resumindo, Jesus não morreu na cruz, de acordo com o Islã e, se Jesus não morreu na cruz, ele não poderia ter ressuscitado dos mortos. Logo, por implicação clara e direta, a ressurreição de Jesus é negada pelo islã, doutrina que é o pilar central da fé Cristã. 

No capítulo 5:72, 73 do Alcorão é dito que se você crer que Jesus é Deus ou crer na Trindade, então você será lançado no inferno. No capítulo 5:116 do Alcorão, Jesus nega qualquer afirmação de ser divino (está explícito também neste verso que Maria fazia parte da Trindade). Então, o que temos ainda? No capítulo 3 do Alcorão você pode crer que Jesus curou os leprosos, restaurou a vista aos cegos, curou os surdos e ressuscitou os mortos. Lá também Jesus é o Messias nascido de uma virgem, filho de Maria e aquele que voltará no fim dos tempos. Ora, você pode crer nisso tudo, mas não pode crer que Jesus morreu na cruz, que ele ressuscitou dos mortos ou que Jesus é Deus. Agora, perceba o que afirma Romanos 10:9:


Se, com a tua boca, confessares Jesus como Senhor e, em teu coração, creres que Deus o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo. (Romanos 10:9 – grifos meus).


Perceba que a condição necessária para a salvação no Cristianismo é confessar e crer que Jesus é Deus (primeiro grifo) e que Jesus morreu e ressuscitou dentre os mortos (segundo grifo). Perceba também que são exatamente estas mesmas coisas que o Islã nega doutrinariamente. Isto não é uma coincidência. Constate que a principal polêmica do islã contra o Cristianismo diz respeito a divindade de Jesus na Cristologia, ou seja, a principal pergunta para ambas revelações é “Quem é Jesus?” (Mateus 16: 13, 15). Ele morreu na cruz? Ele afirmou ser Deus? 

Outro ponto da narrativa do Islã sobre Jesus são as afirmações que negam fatos históricos amplamente conhecidos sobre a vida de Jesus. O Islã nega pontos históricos cardeais para a fé Cristã, pontos estes que são reconhecidos pelas testemunhas oculares dos fatos do Novo Testamento e pelos próprios inimigos do Cristianismo, as chamadas testemunhas hostis. Temos então dois conjuntos de fatos sobre o Jesus histórico, a saber, os fatos amplamente divulgados na história antes da formação do Islã no século sétimo d. C., fatos nunca negados pelos inimigos da fé cristã e os pretensos “fatos” do Islã em negar uma gama inumerável de fontes que apoiam o Novo Testamento. Para se ter uma ideia, apenas abordando 10 fontes antigas não cristãs e algumas até inimigas, saberíamos que Jesus: 1 – Viveu durante o tempo de Tibério César; 2 – Viveu uma vida virtuosa; 3 – Realizou Maravilhas; 4 - Teve um irmão chamado Tiago; 5 – Foi aclamado como Messias; 6 – Foi crucificado a mando de Pôncio Pilatos; 7 – Foi crucificado na véspera da Páscoa Judaica; 8 – Trevas e um terremoto aconteceram quando ele morreu; 9 – Seus discípulos acreditaram que ele ressuscitara dos mortos; 10 – Seus discípulos estavam dispostos a morrer por sua crença; 11 – O cristianismo espalhou-se rapidamente, chegando até Roma; 12 – Seus discípulos negavam os deuses romanos e adoravam Jesus como Deus. FONTES: Josefo; Tácito; Plínio, o jovem; Flegon; Talo; Suetônio; Luciano; Celso; Mara Bar-Serapião; e o Talmude de Babilônia.

Está claro que os quatro pontos grifados são negados categoricamente no Alcorão exatamente porque no século sétimo, no centro do deserto da Arábia, um homem entra em uma caverna, recebe supostamente a visita de um anjo que lhe diz que Jesus era muçulmano (centenas de anos antes do Islã existir), que Jesus não morreu na cruz e que, por implicação, Jesus não ressuscitou dos mortos. 

Historicamente, ninguém ousou dizer, antes do surgimento do Islã, que Jesus não morreu por crucificação ou que ele sobreviveu a crucificação. O que a apologética muçulmana responde a todas estas testemunhas da história? Baseados nos versos do Alcorão citados acima, eles afirmam que Jesus nem foi morto, nem foi crucificado, é a chamada Teoria da Substituição. Os muçulmanos teorizam que Jesus sequer foi colocado na cruz e o verso diz que pareceu para eles que era Jesus. Eles dizem que Allah fez parecer que era Jesus na cruz. Mas, como Allah fez isso? As mais antigas explicações muçulmanas para esse detalhe é que Allah supostamente colocou o rosto de Jesus em outra pessoa e essa outra pessoa foi crucificada no lugar de Jesus. Mas quem? Judas é um dos que os muçulmanos dizem que foi colocado na cruz no lugar de Jesus e o outro é Simão Cireneu, pois foi a pessoa que conduziu a cruz no lugar de Jesus e, segunda a narrativa da apologética muçulmana, ao chegar no lugar da crucificação, foi confundido com Jesus e crucificado no lugar dele. Estes são os argumentos da substituição que são usados. Mas aqui temos um dilema para o Islã. No capítulo 3:55 do Alcorão é dito que Allah enganou as pessoas que estavam na cena da crucificação, fazendo com que outra pessoa fosse crucificada no lugar de Jesus, contribuindo assim com o próprio surgimento do Cristianismo. Neste caso, sendo verdadeira esta teoria, Allah é o responsável pelo engano que é o Cristianismo. Este é um dos grandes problemas para os apologistas muçulmanos. É aqui que agradeço a oportunidade de prefaciar o livro do professor Wellington Galindo que, dotado de um espírito investigativo, se aventurou nos caminhos do orientalismo e se debruçou para ler, pesquisar e escrever sobre o islã. Espero que Deus levante outros pesquisadores e escritores sobre o tema e que muitos apologistas cristãos e evangelistas aos muçulmanos sejam encorajados a saírem de suas posições de timidez e se arvorem a confrontar as doutrinas equivocadas do islã sobre a fé cristã.


Recife, 24 de julho de 2022.


Walson Sales é Presbítero da IEADPE, Teólogo (UMESP), Filósofo (UFPE), Tradutor e Escritor.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2022

Como o arminiano responde a 2Ts 3.2, “a fé não é de todos”?

 

A cláusula final,  porque a fé não é de todos, visa ser uma explicação da conduta hostil dalguns.  Fé  aqui pode ser entendida no sentido de confiança (nem todos os homens exercem fé) ou, menos provavelmente, como o corpo da fé (nem todos os homens aceitam a fé). As versões oferecidas por Frame, pág. 292, “pois a fé não é para todos” e “não são todos que são atraídos pela fé,” são menos prováveis que a de “porque nem todos os homens têm fé” (RSV), que entende a cláusula como espelho de experiência de Paulo. A declaração talvez pareça um pouco banal e desnecessária. Terá maior relevância se for visto não tanto como conclusão daquilo que acaba de ser dito quanto como introdução ao versículo seguinte; ou seja, Paulo a escreveu para servir de ligação com o versículo seguinte ao invés de ser uma declaração importante isoladamente. Ao mesmo tempo, a cláusula transmite o reconhecimento de Paulo de que, embora a oração seja em prol da pregação bem-sucedida da palavra, nem todos creem nem crerão.


I. Howard Marshall,  I e II Tessalonicenses: Introdução e Comentário, p. 250