quarta-feira, 10 de dezembro de 2025

Série Cosmovisões: Definindo o Relativismo moral e demonstrando suas fraquezas

Parte 3 – Os erros principais do Relativismo individual

Por Walson Sales

O relativismo moral, em suas diferentes manifestações, é uma das cosmovisões mais populares entre os jovens e entre os círculos secularizados das sociedades ocidentais. Depois de abordarmos as fraquezas do relativismo moral de forma geral e do relativismo cultural especificamente nas partes anteriores desta série, voltamo-nos agora para uma das formas mais comuns, ainda que filosoficamente frágeis: o relativismo individual. Essa abordagem sustenta que o padrão do certo e do errado se origina exclusivamente nas preferências pessoais de cada indivíduo. Em outras palavras, o relativismo individual sustenta que algo é certo ou errado porque o sujeito crê assim, e não porque haja um padrão objetivo além dele mesmo.

Baseando-se no texto do professor Sean McDowell, no capítulo “O que é o relativismo moral e qual é sua falha essencial?”, constante na obra Guia Geral da Apologética Cristã (2023), editada por Joseph M. Holden, este artigo irá expor os três principais erros dessa posição, ampliar seus desdobramentos filosóficos e sociais, e demonstrar por que tal perspectiva é insustentável para a vida prática, para a justiça e para os direitos humanos.

1. A contradição entre o relativismo e a denúncia do mal

A primeira e mais clara inconsistência do relativismo individual é a sua incapacidade de lidar com o problema do mal. McDowell observa que os mesmos indivíduos que defendem o relativismo moral como uma forma de liberdade ética pessoal frequentemente levantam a objeção do mal como argumento contra a existência de Deus. Referem-se a horrores como o genocídio, o racismo, o estupro, a tortura e outras atrocidades como exemplos de que Deus não pode existir – afinal, como um Deus bom permitiria tanto sofrimento?

Contudo, essa objeção revela a autonegação do relativismo. Ao classificar tais ações como “más”, o indivíduo está, ainda que involuntariamente, apelando a um padrão moral objetivo – algo que transcende culturas, épocas ou vontades individuais. Em termos filosóficos, essa linha de raciocínio supõe que existem valores universais que todos deveriam reconhecer. E se o mal existe, então o bem deve existir, pois o mal é, como definiu Agostinho, uma privação do bem, e não uma entidade em si mesma.

O relativismo individual, portanto, entra em contradição: para fazer sua crítica, precisa lançar mão daquilo que nega. Ele não pode denunciar o mal absoluto sem recorrer a um bem absoluto que transcende o indivíduo. Tal incoerência demonstra a inviabilidade do relativismo como cosmovisão funcional.

2. A impossibilidade de progresso moral

Outro erro crítico do relativismo individual reside na ideia de melhoria moral. Sean McDowell aponta que, se não há um padrão externo ao indivíduo, então qualquer mudança em sua conduta é apenas uma variação – e não necessariamente um avanço. Se o que determina o certo e o errado é unicamente o que o sujeito crê, então um assassino que passa a respeitar a vida humana não se tornou “melhor”, apenas mudou sua perspectiva. Moralmente, uma ação não pode ser qualificada como superior à outra se não houver um critério acima do indivíduo que as compare.

A contradição torna-se evidente na própria linguagem dos relativistas. Muitos afirmam que “melhoraram como pessoa”, que “amadureceram”, que “superaram preconceitos” ou que agora “valorizam mais a dignidade humana”. Mas se o relativismo individual é verdadeiro, todas essas afirmações são vazias, porque “melhorar” pressupõe um padrão de referência superior ao estado anterior – algo que o relativismo nega.

Essa inconsistência revela que, em momentos cruciais, mesmo o relativista se vê compelido a apelar a noções de moralidade objetiva. Ele deseja ser elogiado por sua evolução moral, mas não pode justificá-la dentro de sua própria estrutura relativista.

3. A desintegração dos conceitos de louvor e culpa

O terceiro erro é tão destrutivo quanto os anteriores. McDowell afirma que, segundo o relativismo individual, não existe padrão moral fora do eu. Logo, todo julgamento moral perde o sentido. Isso significa que ninguém pode ser verdadeiramente culpado – nem verdadeiramente elogiado. Se cada um define sua própria moralidade, qualquer conduta é justificável desde que a pessoa a aceite como correta. Isso anula, de forma prática, os conceitos de responsabilidade, justiça e retidão.

Como apontado por diversos pensadores cristãos, entre eles Francis Schaeffer e Ravi Zacharias, uma sociedade que perde o senso de culpa perde também a noção de justiça. A justiça pressupõe padrões. A punição do mal exige que algo seja reconhecido como mal independentemente da vontade do transgressor.

Um exemplo trágico e real dessa lógica aparece no julgamento do serial killer americano Jeffrey Dahmer, que matou, estuprou e canibalizou diversas vítimas. Em seu depoimento, Dahmer declarou que não se sentia culpado por seus atos, pois havia sido educado para crer que o ser humano era apenas produto da evolução, sem alma, sem propósito e sem Deus. Ele afirmou: “Se Deus não existe, então por que me importar com o certo e o errado?”

Essa declaração chocante ecoa a famosa frase de Fiódor Dostoiévski, no romance Os Irmãos Karamázov: “Se Deus não existe, então tudo é permitido.” De fato, se não há uma fonte transcendente de moralidade, então o comportamento de Dahmer, por mais repulsivo que seja, não pode ser objetivamente condenado – o que é moralmente absurdo e psicologicamente insustentável.

4. Implicações destrutivas para a sociedade, os direitos humanos e a justiça

As consequências do relativismo individual não se restringem à teoria. Elas desintegram os fundamentos da convivência civilizada. Se cada indivíduo é a medida do certo e do errado, a sociedade torna-se uma arena de vontades conflitantes, sem um critério para mediar disputas. A justiça se reduz a um jogo de poder. O direito se torna um instrumento de manipulação. Os direitos humanos, cuja validade depende da dignidade intrínseca do ser humano (fundamentada na imago Dei), perdem seu valor, pois deixam de ser universais.

O teólogo Norman Geisler afirmou com razão que sem valores morais objetivos, não há base sólida para os direitos humanos. Se o relativismo individual prevalecer, os mais fortes sempre imporão suas verdades pessoais aos mais fracos – e ninguém poderá dizer, com autoridade moral, que isso é injusto.

Conclusão

Conforme demonstrado, o relativismo individual é uma cosmovisão que se destrói a si mesma. Ele exige coerência, mas só sobrevive por meio da incoerência. Ele afirma que não há padrões objetivos, mas precisa de tais padrões para condenar o mal, para elogiar o bem, para justificar mudanças morais e para exigir justiça.

Como argumenta Sean McDowell, mesmo os que afirmam ser relativistas não vivem como tal. Eles sabem, em seu coração, que algumas coisas são realmente más – e outras realmente boas. Essa consciência moral é a evidência de que fomos criados por um Deus moral, cuja lei está impressa em nossa consciência (Rm 2.15). O relativismo individual, quando levado às suas últimas consequências, conduz à barbárie, à injustiça e à negação do próprio valor humano.

A apologética cristã tem, portanto, a responsabilidade de desmascarar esse engano e de apresentar a superioridade da cosmovisão cristã, que afirma a existência de verdades morais universais, fundamentadas no caráter imutável de Deus.

Bibliografia utilizada e sugerida:

- MCDOWELL, Sean. O que é o Relativismo moral e qual é sua falha essencial? In: HOLDEN, Joseph M. Guia Geral da Apologética Cristã. Porto Alegre, RS: Chamada, 2023.  

- DOSTOIÉVSKI, Fiódor. Os Irmãos Karamázov. Tradução de Paulo Bezerra. São Paulo: Editora 34, 2008. 

- SCHAEFFER, Francis A. O Deus que Intervém. São Paulo: Cultura Cristã, 2003.  

- GEISLER, Norman; TUREK, Frank. Não Tenho Fé Suficiente para Ser Ateu. São Paulo: Vida, 2006.  

- ZACHARIAS, Ravi. Pode o Homem Viver sem Deus? São Paulo: Vida, 2003.  

- GREGORY, John. Dahmer’s Confession: I Did What I Did Because I Thought Evolution Is True. The Christian Post.

- CRAIG, William Lane. Apologética Contemporânea: A razão da fé cristã. São Paulo: Vida Nova, 2021.

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